Apreciação final: 7/10
Edição: Bor-Land, Outubro 2005
Género: Solo Instrumental/Jazz
Sítio Oficial: www.carlosbica.com
O contrabaixista Carlos Bica é um dos mais célebres e solicitados músicos nacionais, tendo convivido artisticamente com intérpretes da mais distinta estirpe como António Pinho Vargas, Camané, Janita Salomé, José Mário Branco, Maria João e Mário Laginha, em Portugal, e Paolo Frésu, Aki Takase, Lee Konitz ou Alexandre von Schlippenbach, além-fronteiras. Presentemente, o músico faz parte do projecto Azul - na companhia do guitarrista alemão Frank Möbus e do percussionista americano Jim Black - do Tuomi Trio (com a cantora finlandesa Kristiina Tuomi e o pianista Carsten Daerr) e divide os palcos berlinenses com Sven Klammer (trompetista alemão) e Kalle Kalima (guitarrista finlandês) no trio Bica/Klammer/Kalima. Considerado um dos mais férteis e inventivos músicos jazzda sua geração, Bica apresenta-nos um disco arrojado. Single atreve-se destemidamente a isolar o contrabaixo, a chamá-lo ao foco, a dar-lhe o destaque do papel principal. Aqui, não há mais nada. Apenas Bica e o seu Prosper Colas, de 1891. Pode a ideia não ser totalmente original, pode até o contrabaixo não ser o mais versátil dos instrumentos, mas o génio e a intuição de Bica levam-nos à deriva num embalo mágico, feito de melancolias e de pesares que se desenlaçam dos vibratos e assumem um corpo próprio. Há nas composições uma alma profundamente lusitana, uma tímida fragrância de saudade, um quase-fado que se insinua na sensualidade dos tons graves.
Single é a quimera musical das fotos de Pedro Cláudio que habitam o booklet do álbum. É uma ilusão em melodias obstinadas da pureza da abóbada celeste, do bulício da urbe, da misantropia de um corvo, do cinzento frio de uma pedra, da vastidão dos oceanos, da efervescência do fogo, do adeus de um pôr de sol, do frio da neve, do recato de um terreiro. Single é tudo isso. É um contrabaixo sozinho, o músico é um mero artífice, um veio mecânico que pulsa das cordas as notas que já lá estão, à espera da revelação. E Bica mostra-as como poucos, exibe-as cruamente, sem artimanhas de estúdio. Como nos curiosos cinquenta e sete segundos dedicados a "Ay! Linda Amiga", uma composição anónima do século XVI, a única peça não original de um alinhamento minimalista. O conceito solitário que Carlos Bica propõe com Single é tão intuitivo que suscita óbvio debate: com este alcance no contrabaixo, quem reclama outros instrumentos?
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