Apreciação final: 8/10
Edição: Tzadik, Novembro 2005
Género: Free Jazz-Rock/Improviso/Fusão
Sítio Oficial: www.tzadik.com
O que se pode esperar de um ensemble que reúne, além do saxofone do poliglota musical e maestro /compositor John Zorn, as aptidões reconhecidas do percussionista brasileiro Cyro Baptista, dos bateristas Joey Baron e Kenny Wollesen, do baixista Trevor Dunn (colaborador regular de Mike Patton no projecto Fantômas), do guitarrista Mark Ribot (líder do colectivo Los Cubanos Postizos), do teclista Jamie Saft e do improvisador digital japonês Ikue Mori? Certamente pode esperar-se tudo o que é a antítese da convenção. O paradigma desta ilustre Electric Masada é, como decorre dos manuais inventivos de Zorn, virar a música do avesso, remisturar conceitos numa linguagem musical universal, carregada de referências transversais que percorrem uma multitude de géneros, desde o misticismo dos ritmos orientais a um certo ritualismo pagão da música africana, do tempero acalorado das cadências latinas ao colorido inesgotável do klezmer, da elasticidade do jazz ao laconismo dos blues, do psicadelismo do noise rock ao pulsar confortável do funk, das alucinações do free jazz à precisão da composição regrada. Deste aparente caos não resulta um jogo babélico, antes se afirma uma impressão musical autónoma cuja lei maior é a transgressão de normas. O produto da Electric Masada, aqui registando em disco duplo alguns momentos de actuações ao vivo do octeto (Moscovo e Ljubliana), é uma massa sonora de incomum intensidade e de acutilância electrizante, jogando habilmente com as alternâncias que os diálogos de instrumentos propõem e que as derivações de ritmo suportam. Depois, nenhum dos músicos se sobrepõe aos demais: o sax alto de Zorn é gracioso, a guitarra de Ribot é tão cabalmente hostil como amistosa, o baixo de Dunn faz marcação cerrada à vibração das percussões e, para fechar o conjunto com chave dourada, as interferências digitais de Mori e as ramificações analógicas de Saft acrescentam ingredientes preciosos a esta genuína recreação de várias longitudes culturais.
At the Mountains of Madness é uma excursão musical sem rédeas e sem limites. Expede-nos, entre as alusões bem-vindas à identidade musical de Miles Davis, dos saudosos Naked City (de Zorn) ou do lendário Frank Zappa, para o songbook que Zorn encetou no dealbar da década de 90, a ilustre série Masada, supostamente um conjunto de peças (mais de 200!) passíveis de serem tocadas em qualquer género musical. Tal como o melhor material da Masada, a matriz melódica é, aqui, ecléctica e alterna entre os instantes mais atmosféricos e os jams mais furiosos de improviso jazz, com os indissociáveis adereços rock. Única reclamação: com tantas composições para escolher porquê repetir - mesmo sabendo-se que o improviso torna cada interpretação uma peça única - seis delas nos dois discos desta edição? Esquecendo esse pormenor, At the Mountains of Madness é um documento imprescindível e tem um discurso tão multilingue que dispensa tradução. A música como linguagem universal.
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